O grande erro que nós, brasileiros, temos cometido ao tentarmos entender empresas como Uber, Netflix e Spotify é aplicarmos réguas do passado para medirmos os novos serviços oferecidos. Os serviços oferecidos por estas empresas são, definitivamente, a ponta de um enorme iceberg que é a economia do compartilhamento/sharing economy.
Esta nova economia tem alterado o eixo principal do capitalismo mundial como o conhecemos há séculos. A base fundamental do capitalismo tem sido possuir e acumular a maior quantidade possível de bens. No capitalismo tradicional cada venda representa a saída de um produto e a obtenção de propriedade por parte do comprador.
A estratégia central da economia compartilhada é vender o mesmo produto por diversas vezes, sem que o comprador obtenha a propriedade do bem usufruído.
Noto três características básicas nesta sharing economy: compartilhamento, por óbvio; uso avançado da Internet e de redes móveis e; comprometimento com os clientes através das redes sociais e "rankeamento" dos serviços.
Sem o entendimento desta grande revolução econômica que vem alterando os rumos dos mercados, tendemos a enxergar as empresas oriundas da Economia Compartilhada com um olhar único e ultrapassado.
Por desconhecimento, ao tentarmos entender o fenômeno Uber, naturalmente achamos que se trata de uma espécie de táxi melhorado. Netflix seria, apenas, um cinema em casa, algo que veio substituir as locadoras de DVD. ZipCar uma locadora de carros, nos moldes tradicionais. Airbnb não seria nada mais que particulares fazendo o papel de hotéis.
Um olhar míope sobre os atores da economia compartilhada nos levará a uma imagem equívoca do fenômeno e das empresas envolvidas.
Cabe à imprensa brasileira e à academia, por meio da difusão de informações, trazer um óculos para o olhar embaçado para que possamos enxergar de forma completa este enorme iceberg chamado de economia compartilhada.
A opção simples e distorcida de jogar um novo serviço tecnológico na ilegalidade mostrou-se, no passado, ineficaz. A guerra travada pela indústria da música contra o Napster, programa de compartilhamento de músicas, provou que uma aparente vitória legal foi, na verdade, uma derrota na prática, pois o compartilhamento de músicas aumentou de forma alarmante.
Sustento isso por enxergar certa similaridade em relação a discussões passadas travadas entre nichos consolidados e as novas opções geradas pela tecnologia. O livro digital não matou o livro físico, pelo contrário, as vendas dos últimos aumentaram. O Facebook não eliminou as amizades no mundo real, de forma oposta, incrementou-as. Graças aos serviços de streaming de música, um número imenso de pessoas está pagando para ouvir música, turbinando o mercado fonográfico e deixando de compartilhar músicas de forma gratuita e pirata.
*Frederico Meinberg Ceroy, 39, é especialista em direito digital / CyberLaw, promotor de justiça - coordenador da comissão de Direito Digital - CODD, presidente do Instituto Brasileiro de Direito Digital - IBDDIG (www.ibddig.com.br), doutorando em Direito e autor dos livros "Coletânea Legislativa de Direito Digital" e "Marco Civil da Internet Comentado".